sexta-feira, 21 de outubro de 2011

A fuga para o espelho...


Dizem que: “Espelho não mente”. Narciso, debruçado sobre a fonte, disse: “Fica, peço-te, fica! Se não posso tocar-te, deixe-me pelo menos admirar-te!” e morreu contemplando uma incauta ilusão. A madrasta de Branca de Neve, olhando-se no espelho, perguntou: “Espelho, espelho meu, existe alguém mais bela do que eu?” e o espelho desfez sua ilusão. Cecília Meireles escreveu: “Em que espelho ficou perdida a minha face?” e, no próprio poema, o eu lírico desvenda sua amarga ilusão. Desde os gregos até a “moderna-idade”, a fuga para o espelho tem revelado a busca do homem por si mesmo e/ou pelo mundo em que ele habita. De Guimarães Rosa, passando por Machado de Assis, a Chaia Zisman, sempre haverá um texto em que o espelho será o centro de todas as atenções. Ele aguça a curiosidade, atiça os desejos e desvenda os mistérios...

A sombra esquizóide de “Constância” escreveu: “Refletida no espelho não conseguia visualizar-me. Eu estava ausente. Via ali uma sombra difusa, confusa. Mas era narcisista. Contemplava uma efemeridade. Contemplava o espectro de Constância e, em seus olhos, eu via a tristeza, o vazio e o medo escondido num véu de ilusão. Bem que eu lutava e lutava... e novamente o espelho. Disfarce. Fantasia. E narcisisticamente me contemplava e contemplava Constância”. O que fez a personagem-sombra? Jogou o espelho ao chão, pisoteou-o, mas mil pedacinhos continuavam contemplando-a. A ela só restou ir dormir, porque o dia seguinte seria longo.

Assim são as diferentes histórias que se vê por aí. Muitas delas embrenhadas em sonhos e pesadelos. Ou melhor, o sonho pode não passar de uma dolorosa similitude com o pesadelo. Paradoxos que o espelho trata de desfazer. A maioria das pessoas esquece de se olhar no espelho... E muitas nem se olham porque já não se reconhecem. Outras se miram horas e horas e contemplam uma imagem que, embora refletida, não são delas. Se é para se iludir, é melhor ouvir Bach, Chopin, Missal, Strauss ou, quiçá, sair por aí e tomar um chope no bar da esquina. Cria-se um mundo à parte e, a partir dele, vive-se uma vida de mentira. Tudo se torna uma grande mentira. E grandes mentiras com o tempo se tornam grandes verdades, embora a recíproca também possa ser verdadeira. Aí surgem as dores, os temores... Os fantasmas! “Mas isso pouco importa. Quando principia o amanhecer, que diferença faz o galo que canta?”, né, Constância, de todo jeito vamos ter de acordar mesmo!?


Autor: Roziner Guimarães

imagem copiada do "diário da minha Psiquê". 

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